Sonia Hirsch
Didó
Didó
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No meio da grande floresta, junto a uma clareira, vive o curandeiro Didó. Nem alto nem baixo, nem gordo nem magro, nem bonito nem feio, nem simpático nem antipático: um tipo que às vezes nem se percebe que está ali, às vezes percebe-se tanto que mal se vê o que está em volta.
Didó tem o dom de curar os doentes, que só de chegar perto já se sentem melhor. Por isso todas as pessoas e todos os animais da floresta conhecem o caminho da casa dele, e ali vão dar a pé ou de barco, pois um riozinho atravessa a clareira, ou então por via aérea, de galho em galho e de cipó em cipó.
A vida de Didó é pacata. Acorda antes do sol, espreguiça como se tivesse dormido cem anos, lava o rosto com água fria. Quando o dia começa a amanhecer ele já está caminhando pela floresta.
Fala com bichos e plantas, colhe ervas, recolhe orvalho, sobe nas árvores para visitar ninhos, ouve a conversa dos passarinhos, dá palpite na arrumação das samambaias e só volta para casa quando o sol já está lá em cima.
Se ele mora sozinho? Que nada! Na mesma casa vivem Mariquinha, Golias e Paiê.
Mariquinha baixinha, gorducha, engraçada, casada com Golias enorme, magro e sério. Paiê, um índio centenário de cabelos na cintura e campeão mundial de rugas, foi quem criou Didó.
Já era velho quando Didó nasceu.
Olhou para a cara do guri, olhou para a mãe do guri, falou: Me dá? Muito espantada, ela perguntou: Pra quê? Paiê respondeu: Pra criar, que suncê já tem outros e eu não tenho nenhum.
A mãe de Didó pensou, pensou, decidiu: Deixa ele comigo enquanto estiver mamando.
Quando a boca se encher de dente suncê pode vir pegar.
Dizem que foi daí que surgiu o nome do curandeiro, que de vez em quando a mãe reparava em mais um dente nascendo nele, aí soltava uma lágrima e se alguém perguntava o de quê do choro ela respondia: De dó!